Contrariando os números, Kalil anuncia flexibilização que inclui Emeis

Ocupação de UTIs permanece na faixa vermelha, não há adiantamento da vacinação e índices de casos estão mais de 20 vezes acima da meta

Você pode conferir a coletiva de imprensa completa diretamente por aqui.

Em coletiva de imprensa realizada na segunda-feira (19/04), o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), anunciou um grande plano de flexibilização das atividades não essenciais. Nas palavras do próprio prefeito o plano representa uma “reabertura quase que geral”, que inclui comércio, bares, restaurantes, academias, pistas, praças, parques, templos e igrejas a partir da quinta-feira (22/04) e da Educação Infantil a partir de segunda-feira (26/04)

O plano significa mais que um retorno para situação anterior ao dia 6 de março, quando a cidade foi fechada por apresentar tendência de alta em todos os indicadores da pandemia, o que levou a cidade à níveis críticos na Taxa de Transmissão (rTs) e ao colapso do sistema de saúde e estrangulamento do sistema funerário. Mas, é ainda mais permissivo em relação aos horários de funcionamento, dispensando agendamento nos atendimento de serviço de estética e academias. O novo plano também autoriza o retorno para a Educação Infantil para crianças de 0 à 5 anos e 8 meses.

Flexibilização pode reverter tendência de baixa

Diante da recuperação de colapso vivido na cidade nos últimos dois meses, os números apresentados pela Prefeitura na segunda-feira apresentam sim uma tendencia de queda, o que já significa uma melhoria significativa no controle da pandemia. Isso demonstra, mais uma vez, que as restrições são de fato efetivas para o controle. Contudo, consideramos que uma flexibilização tão radical pode por tudo a perder, veja os números:

  • A Taxa de Transmissão (rT) na cidade nos últimos 7 dias caiu para 0,90, o que significa que cada grupo de 100 infectados transmite o vírus a outras 90 pessoas. O índice significa uma desaceleração, mas permanece alto. Para controlar a pandemia, é preciso que as medidas de restrição garantam a manutenção do rT abaixo de 1. No dia 15 de março, Belo Horizonte atingiu o seu recorde com taxa de 1,28, considerada gravíssima, esse número só foi atingido devido a morosidade para se tomar providencias diante da alta de casos.
  • A taxa de ocupação de leitos de UTI permanece muito alta com 81,1% de ocupação e fila de espera de 36 pessoas nas UPAs aguardando transferência. O índice é igual ao do dia 6 de março, quando o prefeito Alexandre Kalil (PSD) alegou que “Belo Horizonte voltou a estaca zero”. Vale ressaltar que a fila de espera em Belo Horizonte chegou a ter 228 pessoas. Apesar da melhora, ainda há pessoas morrendo por falta de atendimento.
  • Número de óbitos e sepultamentos também apresenta tendência de queda, mas permanece alto, com 27 sepultamentos dia. O recorde aconteceu no início do mês, quando se atingiu a marcar de 77 mortes, gerando colapso no sistema.

O que percebemos, a partir da análise dos números é que a prefeitura se utiliza da melhoria significativa nos indicadores para propagandear o controle da pandemia, o que está longe de ser verdade. A saída do estado de colapso representa um pequeno suspiro, o que é bem diferente de um bom controle.

Problemas graves permanecem sem solução

Ao ser questionado sobre o problema da superlotação no transporte coletivo, o Prefeito permanece alegando que não há solução para a questão da BH Trans e dos contratos de ônibus na cidade. Kalil atuou como um verdadeiro Relações Públicas das empresas de ônibus, justificando a redução na frota como consequência do aumento dos combustíveis e redução do número de passageiros. O prefeito chegou a afirmar que as empresas de ônibus estão quebradas, uma contradição evidente para um prefeito que se elegeu afirmando que abriria a caixa preta da BH Trans. Diante dessa constatação, Kalil ponderou que a única alternativa seria aumentar o subsídio pago pela Prefeitura às empresas de transporte, mas sem anunciar qualquer medida.

Segundo reportagem publicada pelo G1, entre dezembro de 2020 e março de 2021, a Prefeitura de Belo Horizonte repassou R$68 milhões em compras antecipadas de vales-transportes para “ajudar” as concessionárias que alegaram dificuldades financeiras durante a pandemia. O fato está sendo investigado pelo Ministério Público, já que empresas não tem cumprido a sua parte no acordo, com a redução do número máximo de passageiros por veículo, o MP também apura outras denúncias de irregularidades no processo de auditoria na BH Trans. Segundo a mesma reportagem, a Prefeitura também não tem cobrado as mais de 22 mil multas geradas por descumprimento de medidas sanitárias no transporte coletivo.

O secretária municipal de saúde, Jackson Machado chegou a afirmar que o maior problema de contágio não acontece no transporte coletivo. Para justificar sua posição ele evocou o estudo PNAD/IBGE, publicado pelo Jornal O Estado de Minas que demonstra que os profissionais da limpeza ocupam quase 70% das internações por Covid-19 na cidade. Apesar de admitir que estes trabalhadores fazem parte do público que depende do transporte, o secretário afirma que “certamente devem haver outras causas”, sem citar quais causas poderiam ser estas.

Além do problema no transporte coletivo, o número de testes de Covid-19 realizados pelo município pela cidade ainda é baixo e tem caído desde o início do ano. A prefeitura admite a situação, apontando a dificuldade na compra de insumos, mas descarta a possibilidade de aumento na subnotificação pois também utiliza outros critérios estatísticos para identificar o rT.

Outros problemas sem solução levantados pelo próprio prefeito são o acelerado aumento no número de moradores de rua e o problema de resíduos sólidos.

Autorização de abertura das escolas é totalmente descabida

A reabertura das Escolas é alvo de um grande debate no Brasil. Se por um lado, encaramos o grande problema da falta de democratização do ensino remoto, junto com quase 2 anos de escolas fechadas. Por outro, ainda não conseguimos estabelecer um controle da pandemia que permita a reabertura gradual.

No plano de flexibilização da PBH não há novidades sobre medidas e protocolos para a reabertura das escolas em Belo Horizonte, tão pouco sobre reposicionamento dos trabalhadores em Educação entre os grupos prioritários na fila de vacinação. A grande mudança está na postura do comitê de enfrentamento, que passou a admitir números de referência nas taxas de contaminação muito maiores do que os que eram defendidos no fim de 2020.

Se em novembro, o Comitê de enfrentamento estabelecia que as aulas presenciais em BH poderiam voltar quando cidade atingisse o patamar de 20 casos de Covid-19 por 100 mil habitantes, o que mudou para que essa posição seja revista em um momento que o índice de contaminação atinge números que superam em mais de 20 vezes a meta? No gráfico abaixo é possível observar que, apesar da tendencia de queda, estamos em um patamar de mais de 450 casos para cada 100 mil habitantes.

Traço pontilhado aponta o índice de referencia indicado como ideal pelo Comitê de enfrentamento a Covid em novembro de 2019. A última atualização realizada no dia 16/04, aponta para o número de 456.1 casos por 100 mil, número 22,8 vezes superior a meta.

Na literatura científica, há artigos com evidências importantes para ambos os lados, seja na defesa da reabertura ou da manutenção do fechamento das escolas. Mas, mesmo nos estudos que defendem a abertura das escolas há unanimidade de que isso só pode acontecer em cenários onde o contágio está controlado. Isso significa a manutenção em índices de rT abaixo de 1 por períodos superiores a um mês, além da manutenção do baixo número de novos casos por 100 mil habitantes. O que é bem diferente do que se vê na cidade.