Embora a pandemia do novo coronavírus tenha apresentado uma ligeira tendência de queda na curva de contágio e mortes diárias nas últimas semanas, ela ainda está bem longe de poder ser considerada sob controle. Segundo o levantamento realizados pelo consórcio de veículos de imprensa da última quarta-feira (16/09), a média de contaminação diária varia entre 35 mil a 40 mil novos casos e quase 1000 mortes por dia. Dessa forma, o Brasil ainda ocupa a segunda posição entre os países em que se mais morre por Covid-19 no mundo, acumulando mais de 134 mil mortos pela doença e quase 4,5 milhões de casos.
A desaceleração na taxa média de transmissão (Rt) é tímida, segundo dados do Imperial Collegeo índice brasileiro atingiu 0,9, o que significa menos de uma nova transmissão por pessoa infectada. Contudo, visto a situação de descontrole pandêmico do estado brasileiro esse já é considerado o menor índice desde Abril e por isso, tem incentivado diversos governos estaduais e municipais a flexibilizar medidas de isolamento social.
Em meio a essas notícias, somado ao fenômeno que tem sido chamado pelos especialistas de “fadiga da quarentena”, em que as pessoas passam a se tornar menos vigilantes e tendem a buscar alternativas que retomem a normalidade de suas vidas antes da Pandemia, duas notícias sobre a possibilidade de retorno às atividades presenciais em Belo Horizonte tem causado muito preocupação entre os trabalhadores em educação e a comunidade escolar: uma manifestação de pais que reivindicam o retorno das aulas presenciais, marcada para este domingo (20/09) e o anúncio de retomada de atividades do Colégio Militar de Belo Horizonte a partir desta segunda-feira (21/09). Mas será que existe a possibilidade de estabelecer protocolos que garantam a saúde e segurança dos trabalhadores e estudantes no atual estágio da pandemia?
O que dizem os especialistas
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), o retorno das estudantes às unidades escolares em locais onde a pandemia ainda não está totalmente controlada pode resultar em um aumento expressivo da transmissão do novo coronavírus. E isso deve a diversos fatores que devem ser ponderados antes de tomar essa decisão.
Estudos recentes realizados pela Universidade de Harvard sobre o comportamento da Covid-19 em crianças indicam que, embora a maioria delas sejam assintomáticas e portanto não são grupo de risco para a doença, elas representam poderosos vetores de disseminação. O estudo, publicado na revista Journal of Pediatrics, aponta que as crianças infectadas apresentam uma carga viral de Covid-19 significativamente mais alta nas vias aéreas – esta parte do corpo é um dos principais vetores transmissão – inclusive se comparada com adultos hospitalizados em UTI.
Essa nova pesquisa, somada a maior dificuldade de implementação de protocolos de controle sanitário entre os mais jovens, como uso de máscaras, distanciamento social e higienização das mãos, além da falta de estrutura para o cumprimento destes protocolos nos colégios brasileiros, indicam que o retorno às atividades presenciais, em um cenário de pouca estabilidade no controle da pandemia, significariam uma verdadeira explosão de novos casos.
Além, disso, é preciso lembrar que o retorno presencial significa também uma mobilização da cidade, com aumento de passageiros nos transportes coletivos e do tempo das viagens, com aumento do fluxo de veículos e congestionamentos. Moradores de regiões periféricas serão ainda mais afetadas, por depender do uso constante e por longos períodos deste tipo de transporte.
Dessa forma, aumentar a mobilidade de crianças e adolescentes pode representar um alto risco para elas mesmas, mas sobretudo para os trabalhadores em Educação, usuários do transporte público, comunidade escolar e seus familiares.
Protocolos para possíveis retomada
A Prefeitura de Belo Horizonte já declarou que as aulas presenciais só devem retornar de 2 a 3 meses depois da consolidação da queda na taxa média de transmissão (Rt). Mas um protocolo para a volta as aulas já foi divulgado pelo Conselho Estadual de Educação.
Não há dúvidas de que serão necessárias muitas mudanças estruturais nas escolas para que essas medidas sejam possíveis, como troca dos sistemas de bebedouro, reformas nos banheiros, instalação de lavatórios, adaptações de salas de aula para beneficiar a ventilação do ambiente, rodizio dos estudantes para reduzir a possibilidade de aglomeração e permitir o distanciamento, além do desenvolvimento de ações junto às famílias dos estudantes para orientar sobre a nova realidade escolar e cuidados com questões socioemocionais que possam impactar o aprendizado.
Mesmo se todas essas medidas forem implementadas, a posição de maior parte da população é que este não é o momento de retorno as aulas. Segundo uma reportagem publicada pelo MG1 sobre o tema, foi publicada uma pesquisa realizada em um grupo de mães de alunos de Bel Horizonte nas redes sociais, em que mais de 90% das participantes de um grupo se posicionaram contra o retorno das aulas presenciais, ponderando a dificuldade de fazer com que as crianças cumpram os protocolos de segurança.
Uma outra pesquisa, realizada pelo Fórum Estadual Permanente de Educação de Minas Gerais (FEPEMG) também apontou que familiares, profissionais e estudantes de Minas Gerais preferem que o retorno presencial não aconteça no momento. Dos mais de 32 mil pessoas que responderam à pesquisa, 50,2% afirmaram que “O retorno deve ocorrer apenas após a vacinação da população” e 38% disseram que “O retorno somente deve acontecer quando os órgãos de Saúde afirmarem que podemos retornar em segurança”. Somando mais de 90% de votos contrários ao retorno neste momento.
Trabalhadores em Educação se mobilizam contra o retorno presencial
Para o Sind-REDE/BH, a pressão para o retorno das aulas presenciais é preocupante, pois vem de vários setores da sociedade, mas ignora o cuidado com a vida. “De um lado os donos de Escolas Particulares que temem ver seus lucros ameaçados com a evasão de estudantes que já perceberam que o Ensino Remoto e a EAD são engodos para manter a cobrança de mensalidade, de outro lado alguns pais de alunos que estão fadigados por terem que conciliar jornadas de trabalho com atenção às crianças e por fim as próprias crianças que sentem falta dos professores e colegas”. Mas o Sindicato alega que nenhum desses motivos compensa o risco de uma explosão de novos casos, “o anúncio do Colégio Militar é uma decisão que descola das orientações geradas até agora e demonstra o imenso descaso com a vida das crianças, famílias e trabalhadores”, pondera a diretoria.
Além disso, em resposta a manifestação que pressiona pelo retorno presencial das atividades, convocada para este domingo, o Sind-REDE/BH vê como necessária a mobilização dos setores da sociedade que se opõem ao retorno presencial em um momento tão delicado.
A manifestação também acontecerá neste domingo (20/09), em forma de carreata (para que seja respeitado o distanciamento social) e terá a concentração na Praça da Estação, às 9h. “Nosso objetivo não é entrar em confronto com os manifestantes que querem a volta das atividades, mas chamar a atenção para o que isso representa”.
A carreata sairá às 10h da Praça da Estação e partirá em direção a rodoviária, o percurso seguirá pela Av. do Contorno e se finalizará novamente na Praça da Estação.
