O termo passar a boiada, utilizado pelo ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles na fatídica reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, passou a ganhar novos tristes contornos nesta terça-feira (03/08). Isso aconteceu após a aprovação do Projeto de Lei 2.633/2020, conhecido como “PL da Grilagem”, pela Câmara dos Deputados.
O projeto, de autoria do deputado Zé Silva (Solidariedade/MG) é fortemente criticado por especialistas, pesquisadores e entidades defensoras do meio ambientes. As entidades, como o Greenpeace, afirmam que o projeto visa legalizar o roubo de terras públicas, pois prevê regularização fundiária de terras da União por autodeclaração, reduz o controle e fiscalização de terras públicas e facilita a regularização de imóveis em terras de desmatamento ilegal, favorecendo interesses particulares e abrindo caminho para anistiar grileiros e criminosos ambientais, mesmo em casos de flagrante ilegalidade.
O projeto é inspirado em uma Medida Provisória, proposta pelo governo Federal que perdeu a validade na semana passada. Apesar de manter textos parecidos, o PL atenua dois pontos da Medida Provisória, em relação a extensão das terras que podem ser regularizadas e ao Marco Temporal.
A MP permitia previa a expansão da regularização de terras de até 15 módulos, já o PL prevê a expansão para 6 módulos. Atualmente a regularização é restrita a 4 módulos. Em relação ao Marco Temporal, que determina o prazo para regularização de terras apossadas, invadidas e desmatadas, a MP previa o seu adiamento para 2014, mas o Lei 2.633/2020 manteve o marco da lei anterior (lei 11952/2009), fixado em 2008.
Mas, por não conseguirem alterar o marco temporal, o projeto criou um dispositivo que possibilita dar anistia eterna aos grileiros. Alegando “segurança jurídica”, um artigo permite que áreas não passíveis de regularização possam ser vendidas por licitação a partir de regras definidas por decreto do presidente da república. Na prática, o presidente pode legalizar qualquer tipo de invasão, mesmo se for feita após o marco temporal vigente.
Os povos indígenas, quilombolas e unidades de conservação estão especialmente ameaçados, já que os Grileiros passam a ter mais recursos jurídicos para disputar a titularidade das terras invadidas.
Projeto segue para o Senado
Apesar de não estar mais a frente do Ministério desde o dia 23 de junho, a cartilha de Salles tem sido cumprida a risca pela governo Bolsonaro e sua base no Congresso Nacional, que se utiliza da pandemia para “passar a boiada” de destruição ambiental sem o devido debate com a sociedade.
Só com muita pressão da sociedade civil é possível parar a proposta, ou ao menos amenizá-la, pois o projeto segue para o Senado Federal, cuja composição é ainda mais propensa a aprovação das pautas ruralistas.
Ao chegar no Senado, existe a proposta de apensar o projeto ao PL 512/2021 de autoria do senador Irajá Abreu (PSD/TO). Caso isso aconteça, é possível que o PL da grilagem avance ainda mais na destruição ambiental, com a proposta de mudança do Marco Temporal para 2019 e redução ainda maior do poder de fiscalização dos órgãos públicos.