Contas municipais tem superávit de 12% nos primeiros quatro meses de 2020

Mesmo assim, Prefeitura intensifica política de cortes nos serviços públicos, especialmente na educação

A Prefeitura utiliza a pandemia do novo coronavírus como justificativa para intensificar cortes no funcionalismo público, mas contas municipais do primeiro quadrimestre de 2020 apresentam crescimento se comparadas com o mesmo período de anos anteriores. É o que aponta pesquisa do Instituto Latino Americano de Estudos Socioeconômicos (Ilaese).

A análise das contas da Prefeitura nos primeiros meses de 2020, apresenta uma conclusão surpreendente, pois engloba 2 meses de pandemia e quarentena, com o fechamento de diversos ramos de atividade econômica. Por isso, a expectativa natural seria uma queda na arrecadação. Porém, Belo Horizonte apresentou um crescimento de 12,11% em sua arrecadação, em relação ao mesmo período do ano passado. Se comparado aos primeiros meses de 2018, o crescimento é 21,71%.

O número espanta, principalmente devido ao cenário de cortes e desinvestimento em diversos setores do serviço público municipal, em especial da educação, onde trabalhadores tem sofrido com a redução direta do poder de compra a partir de cortes de salários, por quebra de contratos de extensão de jornadas e de benefícios como o vale alimentação. O estudo ainda assinala que a inflação acumulada no período, segundo o INPC, foi de 2,46%, o que significa um crescimento real de aproximadamente 10%.

O estudo se limita aos 4 primeiros meses do ano, por já possuir números consolidados e publicizados. O Ilaese utilizou como fonte os dados produzidos pela própria Prefeitura de Belo Horizonte, divulgados a partir de relatórios do Tesouro Nacional, por meio do Siconf e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e confrontados com as publicações do Diário Oficial do Município (DOM).

O estudo levanta algumas hipóteses que podem explicar o crescimento: setor industrial praticamente não parou, se comparado com outras cidades; houve ampliação do valor do Fundeb recebido pelo município; receitas de capital advinda de vendas e privatizações e até mesmo impostos como ICMS, IPVA e Fundo de participação do Municípios cresceram nesse período. O que levanta o questionamento: diante do aumento das receitas, levando em consideração inclusive a ampliação de recursos da Educação, por que a Prefeitura intensifica a política de arrocho salarial e cortes no funcionalismo?

Um fator que ajuda a responder essa pergunta, e que chama a atenção no estudo, é que a tendência de cortes no serviço público é anterior a pandemia do novo coronavírus. Segundo o Ilaese, Belo Horizonte tem uma situação privilegiada, entre os municípios brasileiros, por ser a capital de um estado economicamente muito forte. Apesar disso, BH gasta muito menos com o Serviço Público, em termos percentuais, que as demais capitais brasileiras e município com mais de 1 milhão de habitantes. A capital mineira é o segundo município que menos investe em professores, em relação a sua arrecadação e o terceiro lugar entre as cidades que menos gasta com pessoal. Por outro lado, é o terceiro que mais gasta com vereadores em termos individuais.

Como relatou o economista do Ilaese Gustavo Machado “Querem convencer os trabalhadores que nós temos que abrir mão de tudo diante da situação de crise, passando a impressão de que todos estão fazendo o mesmo, mas isso não é verdade. Há uma extrema desigualdade em quem tem sofrido os danos econômicos da pandemia, com pequenos setores lucrando milhões enquanto muitos lutam para sobreviver”

Cortes seguem a pleno vapor

O Ilaese aponta que a situação de crise, utilizada pela Prefeitura para reduzir o percentual nos investimentos com pessoal, especialmente no setor da educação, é um subterfúgio, pois o ritmo de crescimento é ainda maior que nos períodos anteriores. Mas o governo municipal esconde esses dados para aprofundar ataques e utiliza recursos para intensificar a terceirização dos serviços públicos.

Nos primeiros 4 meses de 2020 houve uma redução de quase 2% nos gastos totais com pessoal se comparado com o mesmo período do ano passado, indo de 42,19% para 40,48%.

Na Educação os investimentos no primeiro quadrimestre despencaram se comparados com o mesmo período do ano passado. Indo de 21,91%, em 2019 para apenas 16,19% em 2020. É possível inferir que esses gastos deveriam mesmo cair um pouco devido ao fechamento das escolas, pois caem também os gastos com material. Porém, o grande impacto desses números está no corte de salários e benefícios. No primeiro quadrimestre de 2018, o investimento com pessoal na educação representou 74% do valor bruto do Fundeb. Em 2019, foi de 68,97%. Já em 2020 foi de 60,85%. Uma queda de mais de 8%.
Já o recebimento da Prefeitura em relação ao Fundeb teve um aumento no valor bruto de 13%.

Ao mesmo tempo, houve um salto nos investimentos em empresas privadas e ONGs, para a terceirização de serviços públicos. Só nos contratos da secretaria municipal de educação esse salto foi de 500 milhões em 2018 para 1 bilhão em 2019, do valor anual.

Tantos cortes pode fazer com que muitas pessoas imaginem que Belo Horizonte é uma cidade endividada e que a austeridade é um caminho para colocar as contas do município em dia. Mas essa hipótese não tem base material. A situação de BH é privilegiada em relação a outras capitais e outras cidades do estado. Belo Horizonte não tem um alto índice de endividamento. Mesmo analisando períodos longos, de mais de 10 anos, é perceptível que a cidade tem apresentado um crescimento contínuo muito superior a inflação.

Além disso, há espaço de sobra para investimento em pessoal. A lei de responsabilidade fiscal limita o gasto com servidor a 54% da arrecadação total. Como dito acima, nos primeiros meses de 2020 a Prefeitura gastou apenas 40% com pessoal. Isso representa 14% abaixo do limite legal, colocando em valores isso representa mais de 1 bilhão de reais, que poderia estar sendo investido na melhoria dos serviços públicos e na valorização dos servidores. Se a situação econômica da Prefeitura é melhor do que antes da Pandemia, o que justifica tantos cortes nos direitos dos trabalhadores?

Estudo completo

O Sind-REDE disponibiliza abaixo uma transmissão ao vivo realizada pelo Sind-REDE/BH, no dia 5 de agosto, onde o economista do Ilaese Gustavo Machado explica sobre o método da pesquisa e os números encontrados. Abaixo também disponibilizamos o estudo completo, que pode ser acessado diretamente de nosso site, ou baixado em seu computador clicando AQUI.

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